News Release

Descoberta mostra como infecções perigosas se instalam na pele e resistem aos tratamentos

Estudo internacional liderado por brasileiro revela que a aderência quase inquebrável do Staphylococcus aureus à pele humana explica a gravidade das infecções

Peer-Reviewed Publication

Auburn University Department of Physics

image: 

Illustration of the molecular handshake driving Staphylococcus aureus adhesion to human skin. The bacterial adhesin SdrD (purple) binds tightly to the host receptor desmoglein-1 (DSG-1, orange) on keratinocytes, with calcium ions (Ca²⁺) stabilizing the interaction. This calcium-dependent bond enables S. aureus to attach strongly to the skin surface, providing a molecular explanation for the bacterium’s ability to resist mechanical forces and establish infection.

view more 

Credit: Department of Physics - Auburn University

(Auburn, EUA) Imagine seu filho, ou até você mesmo, com uma pequena coceira causada por uma dermatite. Algo corriqueiro. A unha passa pela pele e abre uma fissura tão minúscula que ninguém conseguiria ver. Esse detalhe já basta para que uma bactéria comum, presente na pele de milhões de pessoas saudáveis, encontre uma brecha. Essa bactéria é o Staphylococcus aureus. Na maioria das vezes, ela vive em paz conosco. Mas quando a barreira da pele está fragilizada, o cenário muda: o microrganismo se prende com uma força inacreditável, multiplica-se e pode transformar uma simples coceira em uma infecção grave. Em casos mais sérios, espalha-se pelo corpo e pode até mesmo levar à morte. Para piorar, algumas cepas já não respondem a antibióticos, tornando-se verdadeiros pesadelos da medicina moderna.

A pergunta que intrigava cientistas era simples e assustadora: como essa bactéria consegue se agarrar de forma tão persistente à pele humana? Agora, uma equipe internacional co-liderada por um cientista brasileiro radicado nos Estados Unidos acaba de revelar a resposta. Publicado na revista Science Advances, o estudo mostra que o Staphylococcus aureus utiliza uma ligação biológica mais forte do que qualquer outra já registrada na natureza — uma adesão que ajuda a explicar a força mortal dessas infecções.

O segredo está em uma proteína da bactéria chamada SdrD, que funciona como um gancho microscópico para se conectar à proteína humana desmogleína-1, presente nas células da pele. O resultado é uma ligação tão forte que rivaliza com ligações químicas covalentes. “É a ligação proteína-proteína não covalente mais forte já registrada”, explica Rafael Bernardi, professor da Auburn University (EUA) e chefe do Laboratório de Biofísica Computacional. “Isso ajuda a entender por que essas infecções são tão persistentes e difíceis de eliminar.”

O papel do cálcio foi outro ponto crucial da descoberta. Sem ele, a ligação entre as proteínas enfraquece. Quando o elemento é reintroduzido, o vínculo não apenas volta, mas se torna ainda mais resistente. Essa descoberta é especialmente importante em casos de dermatite atópica, nos quais o equilíbrio de cálcio da pele é alterado. Em vez de proteger, essa alteração pode tornar a adesão bacteriana ainda mais forte. “Ficamos impressionados com o quanto o cálcio fortalece essa interação”, comenta Priscila Gomes, também brasileira, pesquisadora da Auburn University e coautora do artigo. “Ele estabiliza a proteína bacteriana e torna o complexo muito mais difícil de romper.”

Para chegar a essas conclusões, os cientistas combinaram experimentos com simulações em supercomputadores. Na Europa, usaram microscopia de força atômica para medir a intensidade com que uma única bactéria se prende à proteína da pele. Já nos Estados Unidos, o grupo de Bernardi reproduziu o processo átomo por átomo com modelos computacionais avançados. Os dois caminhos levaram à mesma conclusão: a ligação formada pelo Staphylococcus aureus é a mais forte já medida entre proteínas.

Essa descoberta abre caminho para novas estratégias de combate. Em vez de tentar matar a bactéria com antibióticos — um método que muitas vezes acelera a resistência —, a ideia é impedir que ela se agarre à pele. Sem conseguir se fixar, o Staphylococcus aureus se tornaria muito mais vulnerável ao sistema imunológico. “O alvo aqui não é destruir a bactéria, mas evitar que ela se agarre em primeiro lugar”, reforça Bernardi.


Brasileiros fazendo bonito na ciência internacional

Três dos autores são brasileiros radicados nos Estados Unidos: Rafael Bernardi, Priscila Gomes e Diego Gomes.

Rafael é natural de Cascavel (PR), formou-se em Física pela Universidade Estadual de Londrina, fez mestrado no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (RJ) e doutorado no Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ. Durante o doutorado, realizou estágio na Universidade da Pensilvânia (EUA). Em seguida, foi para a Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, onde fez pós-doutorado e trabalhou como pesquisador. Hoje, lidera seu próprio grupo na Auburn University.

Essa trajetória, somada às de Priscila e Diego, ambos do Rio de Janeiro, reforça a relevância da formação científica brasileira e mostra como pesquisadores do país têm impactado descobertas de ponta. “Este trabalho demonstra o quanto conseguimos avançar quando diferentes áreas e países se unem para responder perguntas que nenhum grupo isolado conseguiria resolver”, reflete Diego Gomes.

A descoberta da ligação proteína-proteína mais forte já registrada é um marco para a biofísica moderna e um motivo de orgulho para a ciência brasileira, que mesmo realizada fora do país, continua a desempenhar papel crucial em problemas médicos que afetam milhões de pessoas ao redor do mundo.


Disclaimer: AAAS and EurekAlert! are not responsible for the accuracy of news releases posted to EurekAlert! by contributing institutions or for the use of any information through the EurekAlert system.