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Mineração de patentes indica rotas promissoras para pesquisas

Metodologia desenvolvida por cientistas brasileiros para lidar com grande volume de dados foi verificada em análise de estudos sobre hemofilia e também pode auxiliar na busca por parcerias e na transferência de tecnologia

Peer-Reviewed Publication

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

Um grupo de pesquisadores afiliados à Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto, Brasil, utilizaram ferramentas de big data, como mineração de dados e análise de redes, para desenvolver um método que facilita a vida de cientistas e de empresas na busca por rotas, tendências e parcerias tecnológicas em qualquer área do conhecimento. A nova metodologia identifica tendências tecnológicas a partir de informações obtidas em bancos internacionais de patentes.

Mais do que levantar as patentes em uma área, o método identifica as rotas tecnológicas utilizadas por empresas e universidades em vários países, as que estão se desenhando como tendência e as redes de parceria entre empresas e instituições científicas que atuam no setor.

O método, descrito em artigo publicado na Nature Biotechnology, é resultado do pós-doutorado do biólogo Cristiano Gonçalves Pereira na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, com Bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa Científica do Estado de São Paulo - FAPESP

Pereira teve orientação de Geciane Silveira Porto, professora na FEA-RP e coordenadora do Núcleo de Pesquisas em Inovação, Gestão Tecnológica e Competitividade (InGTeC). O trabalho contou com colaborações de Virgínia Picanço-Castro e de Dimas Tadeu Covas, respectivamente pesquisadora e coordenador do Centro de Terapia Celular (CTC) - um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) financiados pela FAPESP.

Para desenvolver o método, os pesquisadores utilizaram como exemplo prático o estudo do fator VIII recombinante, proteína produzida sinteticamente a partir de células humanas para tratar pacientes que sofrem da hemofilia do tipo A. Doença que impede a coagulação do sangue, a hemofilia é causada por mutações genéticas que ocorrem nas regiões do DNA do cromossomo X responsáveis pela produção da proteína.

O desenvolvimento de estudos relacionados às rotas tecnológicas do fator VIII recombinante - bem como de energia solar e de biocombustíveis - contou com o apoio da FAPESP, que também concedeu apoio aos pesquisadores para utilizar uma base de patentes que congrega os pedidos feitos em escritórios de registro de propriedade intelectual em todo o mundo.

Avanços na pesquisa sobre hemofilia

Descobrir uma maneira de fazer o fator VIII recombinante atuar por mais tempo no organismo pode melhorar muito a vida de hemofílicos. Com o emprego de novas moléculas conjugadas, seria possível estender a ação da proteína, reduzindo o número de aplicações e diminuindo o custo do tratamento.

Os conhecimentos produzidos no InGTeC e no CTC da USP na análise das patentes do setor permitiram a identificação de uma molécula, chamada XTEN, como grande promissora na inovação da produção do fator VIII recombinante que prolonga sua meia-vida.

Pereira descreve a opção do grupo por pesquisa de patentes, ao invés de artigos científicos. "A base de patentes é mais robusta e permite traçar melhor o estado da arte no campo de interesse. Além disso, citações de artigos científicos são uma escolha, o autor decide quais quer citar na sua pesquisa. Em patentes, é obrigatório citar as que são utilizadas para desenvolver aquela inovação, mesmo que seja patente de um concorrente", disse.

O trabalho detectou outras tendências em pesquisa e inovação na produção do fator VIII recombinante. Um é sua produção em larga escala com maior qualidade.

"As pesquisas caminham no sentido de adicionar suplementos à proteína para ter uma concentração mais robusta e apurada da mesma. Também observamos tecnologias voltadas para reduzir a imunogenicidade, que é a resposta que o organismo do paciente dá à proteína recombinante", disse Pereira. Essa busca se dá porque, mesmo sendo produzido a partir de células humanas, os pacientes podem rejeitar o fator VIII recombinante pelo fato de que o sistema imune pode identificar essa proteína como um corpo estranho e atacá-la.

Redes de cooperação

Para fazer a mineração em banco de patentes, os pesquisadores utilizaram a plataforma Derwent Innovation, que reúne as patentes depositadas em quase 100 escritórios de patentes existentes em todo o mundo, incluindo o Brasil.

Foram encontradas 3.424 patentes sobre o fator VIII recombinante, registradas entre 1997 e 2016, e considerados os últimos 20 anos, por ser o período de vigência de uma patente. Os últimos dois anos ficaram de fora, uma vez que as patentes depositadas nesse período estavam ou estão em período de sigilo, de acordo com as regras de patenteamento.

Depois do levantamento, era preciso ler mais de 3,4 mil documentos, o que não seria possível sem instrumentos da chamada ciência de dados (big data), como a mineração de dados, quando, utilizando ferramentas específicas, faz-se o tratamento dos dados em uso.

Foram empregados métodos como, por exemplo, o de análise de textos, fazendo a mineração dos termos mais citados, e o de análise de redes, que utiliza recursos computacionais para estudar a interação entre atores diversos, em qualquer área.

"Nossa primeira preocupação foi ver como a cooperação ocorre e montar as redes de cooperação. Então, observamos quem são os titulares das patentes, quem está cooperando com quem, a interação universidades-institutos de pesquisa-empresas, quem é o mais e menos influente da rede, quem precisa de parceria e outros fatores", disse.

A pesquisa mostrou, por exemplo, que os Estados Unidos são o principal país quando se trata de produção nesse campo, que há um grupo de empresas europeias que colaboram fortemente entre elas e se mostraram mais influentes em relação aos laços de cooperação e que o Brasil não aparece na rede de colaborações, provavelmente porque o país colabora apenas pontualmente nesse campo.

O passo seguinte foi fazer o estudo de prospecção tecnológica para entender o que tem surgido nos últimos anos e verificar as tendências para os próximos.

"Para isso, utilizamos o estudo de citações e temas de patentes, fazendo uma análise de títulos e a mineração de termos mais frequentes nos últimos 20 anos. Fizemos o mesmo para os últimos cinco anos, de forma a chegarmos nas tendências", disse Pereira.

O método gerou duas redes, uma relacionada às cooperações, identificando empresas ou instituições de pesquisa que seriam os principais nós articuladores das redes, e outra que trata das citações de patentes. "Essa última mostra como uma tecnologia ajudou a construir a outra ou o fluxo do conhecimento", disse o pesquisador apoiado pela FAPESP.

Como as inovações são resultado, em geral, da combinação de mais de uma patente, é possível concluir que uma combinação de patentes mais frequentemente citada indica uma tendência em termos de rota tecnológica.

Para fazer a análise das citações e buscar as rotas tecnológicas, Pereira adaptou um plugin desenvolvido pela equipe do InGTeC ao software Gephi para o cálculo do Search Path Link Count, que calcula quantas vezes a rota mais frequente foi utilizada.

O estudo não resultou em um software ou plataforma automaticamente aplicável, mas, segundo Pereira, é possível reproduzir o método na prospecção de qualquer área a partir das explicações dadas no artigo publicado na Nature Biotechnology.

De olho no mercado

A coordenadora do InGTeC, Geciane Silveira Porto, ressalta que atualmente se observa a valorização das patentes no meio acadêmico, onde tem havido um movimento por aumentar o número de depósitos.

"A proposta de identificar rotas tecnológicas poderá auxiliar pesquisadores a saber quais são as tecnologias emergentes em suas respectivas áreas. Dessa forma, ao delinear os seus projetos de pesquisa, poderão propor estudos que estejam na fronteira científica e tecnológica", disse.

O mapeamento das rotas também é importante para as empresas. "Com ele, é possível disponibilizar para um gerente ou diretor de P&D&I [pesquisa, desenvolvimento e inovação] um cenário em que se pode identificar quais são as tecnologias emergentes em seu setor de atuação, ou em setores nos quais a empresa deseja investir, e comparar o estágio de maturidade tecnológica da sua empresa com as que detêm as principais tecnologias nas rotas mapeadas", disse Porto.

"De posse dessa informação, o gestor pode buscar uma parceria tecnológica, uma transferência de tecnologia ou mesmo adquirir ou investir em empresa quando ela é uma startup. A contribuição da metodologia para a área de inteligência estratégica das empresas é muito significativa", disse.

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Sobre a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) é uma das principais agências públicas brasileiras de fomento à pesquisa. A FAPESP apoia a pesquisa científica e tecnológica por meio de Bolsas e Auxílios a Pesquisa que contemplam todas as áreas do conhecimento. Em 2016, a FAPESP desembolsou R$ 1,137 bilhão, custeando 24.685 projetos, dos quais 53% com vistas à aplicação de resultados, 39% para o avanço do conhecimento e 8% em apoio à infraestrutura de pesquisa. Saiba mais em: http://www.fapesp.br.


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