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Como a maioria dos animais, todos nós hospedamos muitas bactérias benéficas diferentes. Ser benéfico para o hospedeiro é vantajoso para as bactérias, dado que o sucesso do hospedeiro determina a sobrevivência e disseminação do micróbio. Contudo, se as bactérias crescerem demasiado podem-se tornar prejudiciais. Num novo estudo publicado na última edição da revista científica PLOS Biology*, um grupo de investigação do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC; Portugal) descobriu que uma única alteração genómica pode tornar uma bactéria benéfica numa bactéria patogénica, ao aumentar a sua densidade dentro do hospedeiro.
Ewa Chrostek e Luís Teixeira estudaram a simbiose entre a mosca-da-fruta (Drosophila melanogaster) e a bactéria Wolbachia para perceber de que forma uma bactéria benéfica se torna patogénica. A Wolbachia está presente na maioria das espécies de insectos, protegendo alguns deles contra vírus, tal como o vírus da febre da dengue. Estudos anteriores do grupo de investigação de Luís Teixeira mostraram que o número de Wolbachia no interior da mosca-da-fruta determina o seu efeito no hospedeiro. Bactérias que atinjam níveis elevados no interior da mosca tornam-se prejudiciais. Desta forma, a equipa de investigação decidiu investigar qual a base genética responsável pelo controlo da densidade bacteriana no interior do hospedeiro e, consequentemente, responsável pela sua patogenicidade.
A comparação entre variantes de bactérias Wolbachia patogénicas e não-patogénicas sugeriu que o número de repetições de uma região específica do genoma, denominada Octomom, era responsável por diferenças na virulência de Wolbachia. Os investigadores mostraram que o número de cópias desta região é variável nas bactérias entre moscas individuais. As bactérias com mais cópias de Octomom crescem mais rapidamente, atingindo maiores densidades no interior das moscas da fruta. Consequentemente, quanto maior o número de cópias desta região, mais cedo as moscas morrem. Por outro lado, um maior número de cópias da região Octomom e uma elevada densidade de Wolbachia nas moscas fornecem uma proteção antiviral mais forte.
Ewa Chrostek, que acabou recentemente o doutoramento no laboratório de Luís Teixeira, comenta: "Este estudo mostra que o número de cópias de Octomom pode mudar rapidamente, originando resultados diferentes da infeção de Wolbachia na mosca. Estas bactérias podem evoluir muito rapidamente e facilmente fugir ao controlo do hospedeiro." Luís Teixeira explica: "Nós descobrimos uma região do genoma de Wolbachia responsável pela regulação da densidade da bactéria nas moscas. Este é o primeiro estudo que faz a ligação entre os genes e as suas funções na bactéria, o que ajuda à compreensão da simbiose insecto-Wolbachia".
Atualmente, como parte da estratégia para controlar a transmissão da dengue, estão a ser libertados na natureza mosquitos (Aedes aegypti) infetados com a bactéria Wolbachia. A compreensão dos mecanismos da potencial evolução de Wolbachia e da densidade desta bactéria é assim extremamente importante. Este trabalho de investigação foi realizado no Instituto Gulbenkian de Ciência. O estudo foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (Portugal) e pela Wellcome Trust (Reino Unido).
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Ewa Chrostek and Luis Teixeira (2015). Mutualism breakdown by amplification of Wolbachia genes. PLOS Biology.
Journal
PLoS Biology